13 de maio de 2010

Corpo no prumo


*Trata-se de um curto texto sobre questões corporais observadas pelo Analista de Movimento Hubert Godard, Vale a pena Ler!*


Em encontro no Sesc Consolação, o francês Hubert Godard, falou sobre seu método Função Tônica, que envolve princípios da prática do rolfing. A seguir, os principais trechos de sua palestra:
A bioquímica norte-americana Ida Rolf, após 50 anos de estudos, criou e desenvolveu um método de reorganização e reeducação corporal. Sua pesquisa começou quando a medicina tradicional não conseguia mais dar respostas para o problema estrutural do filho. A partir daí, Ida começou a investigar trabalhos que relacionassem função e estrutura: yoga, quiropraxia, osteopatia. Disso resultou o método que ela chamou de Integração Estrutural e seus alunos apelidaram de Rolfing. O francês Hubert Godard, professor de Estética da Dança e Análise do Movimento e especialista na técnica, trabalha com a teoria que nomeou de Função Tônica, modelo teórico que focaliza a resposta da ação da gravidade no corpo humano e identifica os fatores que afetam essa resposta. Em fevereiro, ele esteve no Sesc Consolação, para um encontro com os interessados. A seguir, trechos principais de sua palestra:"Faz três anos que eu tento compreender como ocorre a recepção de um corpo que dança. Esse trabalho foi definido pelo crítico americano John Martin, que denomina esse conceito de "meta-sinética". Se alguém dança na minha frente, eu não posso compreender a dança como uma simples semiótica do gesto. A dança não é mímica e ela não funciona como uma linguagem. Quando eu assisto alguém que dança, eu me torno a própria pessoa que dança e, a partir daí, eu compreendo o que se passa no corpo dela. No caso dos europeus, é importante compreender as limitações corporais dessas pessoas, já que, na Europa, existe, todo o tempo, uma certa proibição da relação entre os corpos. Há uma espécie de repressão do transe dentro da cultura européia. Realizei uma pesquisa em Milão focada na recuperação pós-cirúrgica das mulheres que passam por uma operação dos seios. Percebemos que cerca de 60% das mulheres, após a operação, perde o movimento do balanço do braço. Mesmo numa pequena mastectomia, operação na qual não há déficit muscular ou nervoso, ocorria essa cessação do movimento. Isso é tão misterioso que eu pedia para encontrar com as mulheres antes que elas fossem operadas e, mesmo no período pré-operatório, 30% delas já havia perdido o movimento do braço. Começamos, então, a pensar que talvez uma das causas fosse o simples fato de elas saberem que tinham essa doença e que isso tivesse ocasionado um trauma, relacionado à perda do movimento. No aikidô é feito um exercício de visualização para aprender a fortalecer o braço. Imagina-se que dos dedos sai uma luz que se estende até o infinito. A explicação é que a energia vital (ki), que parte da região central do corpo, ocasiona o fortalecimento do braço. Mas isso não me deixou muito satisfeito. Isso me levou a realizar uma experiência curiosa. Eu ficava na sala com uma mulher, que tinha o braço forte, e pedia ao neurologista que atravessasse a sala. Quando ela via que alguém passava ali, seu braço se dobrava novamente. Começamos então a perceber como funcionava essa perda. Na verdade, só o fato de saber que havia um corpo estranho dentro do seio, no caso, um câncer, fazia com que essas mulheres perdessem a capacidade de projetar o braço no espaço. Mas apenas isso não é suficiente para explicar a perda do movimento. A tradição dizia que as crianças crescem e vão desenvolvendo a imagem do próprio corpo no córtex sensorial. Nós sabemos hoje que o córtex é completamente maleável e passível de mudanças, dependendo dos estímulos externos. No caso das mulheres, o córtex sensorial diminui e o córtex motor não recebe mais informações a respeito do braço. Forma-se um círculo vicioso. No caso da dança, é muito importante fazer uma relação com o manifesto antropofágico de Oswald de Andrade. Se em determinado momento eu perco a capacidade de me projetar no espaço. Como podemos saber se sou eu ou o outro quem está se movimentado? Existe nesta relação uma espécie de transe gravitacional. A organização postural não é comandada somente pelos tecidos do corpo, mas também pela maneira como o meu corpo se projeta no espaço e como ele recebe o espaço. E essas conclusões nos permitiram mudar certos treinamentos típicos no estudo da dança. A maneira como eu busco ou recebo o que vejo, tem imediatamente um efeito na minha relação com a gravidade. Todas as pessoas que fazem um trabalho estrutural ou postural sabem que a chave final da postura é a cabeça e os traços do rosto. Quando você está deitado, por exemplo, os traços do rosto podem se relaxar, mas quando você está de pé, obrigado a ter essa relação com a força da gravidade, isso se mostra claramente nos traços do seu rosto."